REDES, TENSÕES E ADAPTAÇÕES: UMA CARTOGRAFIA DAS PRÁTICAS DE ENSINO DE UMA PROFESSORA DE LÍNGUA PORTUGUESA NA (PÓS)PANDEMIA
Ensino Pandêmico. Teoria Ator-Rede. Cartografia de Controvérsias. Identidade docente. Neoliberalismo e educação.
Esta tese, vinculada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Linguística da Universidade do Estado de Mato Grosso, inserida na linha de pesquisa Estudo de Processos de Práticas Sociais da Linguagem, tem como objetivo investigar em que medida a pandemia da Covid-19 reagregou as práticas de ensino de uma professora de Língua Portuguesa. Nosso estudo se justifica pelos agenciamentos do coronavírus, que impactaram todas as áreas da vida contemporânea, incluindo a língua (gem), a cultura, a ciência, a indústria farmacêutica, as relações sociais, o comércio e o sistema de saúde, e que, por isso, precisam ser problematizados e compreendidos. Teoricamente, o estudo se respalda em Latour (2000, 2012, 2017, 2019, 2021) e em outros autores que adotam uma perspectiva rizomática da realidade. Argumenta-se que é fundamental repensar as paisagens de ensino e o papel daqueles que as sustentam em um mundo pós-pandemia. Portanto, nossa investigação se fundamenta na Teoria Ator-Rede e em perspectivas pós-humanas na Linguística Aplicada, por serem abordagens compatíveis com nossa proposta. Assim, realizou-se um rastreamento das práticas de ensino e aprendizagem de uma professora mato-grossense de Língua Portuguesa, a Lua. Metodologicamente, a pesquisa adotou um viés quantiqualitativo e indutivo, articulando Cartografia de Controvérsias, pesquisa narrativa e análise documental. O corpus incluiu questionários com 107 professores, entrevista com a professora Lua, relatos de alunos, documentos oficiais (Portaria nº 343/2020), notícias institucionais, gravação de aula síncrona, narrativas visuais e o Projeto Político-Pedagógico da Escola Via Láctea. O cruzamento desses dados permitiu capturar associações balizadas por negociações tempestuosas. Por meio da cartografia, os dados revelaram múltiplos desdobramentos, entre eles: I). o Ensino Pandêmico reconfigurou as práticas docentes, transformando os papéis de professores, alunos, tecnologias e outros elementos; II). no cerne dessas intra-ações, emergiram novas identidades docentes, como a docente-ciborgue, resultado da fusão entre humano e tecnologia; III). a alienação técnica em massa gerou frustração e insegurança entre docentes e alunos, agravadas pela falta de formação adequada. IV). a pandemia também aprofundou desigualdades tecnológicas, ampliando disparidades. V). o estudo identificou a influência de uma ideologia neoliberal no discurso do Estado frente à imposição das tecnologias como solução pedagógica. VI) a fusão entre os espaços doméstico e escolar dissolveu as fronteiras entre trabalho e vida pessoal, resultando em esgotamento emocional. VII). o aumento do uso de plataformas digitais fortaleceu a vigilância e a coleta de dados sobre docentes e alunos, intensificando a dependência de Big Techs; VIII). por fim, o estudo demonstrou que o vírus SARS-CoV-2 atuou como um actante sociotécnico, impactando práticas sociais e de linguagem e, consequentemente, redesenhando as dinâmicas de ensino e aprendizagem. Essas constatações reforçam a tese desta pesquisa: o ensino durante a pandemia não foi meramente uma questão de adaptação tecnológica, mas um fenômeno sociotécnico complexo, no qual diferentes atores — humanos e não humanos — reconfiguraram as práticas de ensino e aprendizagem de maneira desigual, expondo tensões entre inovação e exclusão.