ATUAÇÃO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO FRENTE ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E PRESSÕES ANTRÓPICAS NO SISTEMA DE BAIAS SIÁ MARIANA/CHACORORÉ, PANTANAL MATOGROSSENSE
Governança ambiental, comunidades tradicionais, políticas públicas, vulnerabilidade, resiliência, conservação da biodiversidade.
Esta tese aborda a problemática da degradação socioambiental no sistema de baías Chacororé/Siá Mariana, no Pantanal mato-grossense, bioma de relevância global. A pesquisa parte do princípio constitucional do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacando a necessidade de uma gestão ambiental que considere os interesses das gerações presentes e futuras. O Pantanal, com sua dinâmica hidrológica única, o "pulso de inundação", é o foco central, e os estudos se concentraram especificamente no sistema de baías Chacororé/Siá Mariana, em Barão de Melgaço, Mato Grosso. A pesquisa identifica as populações tradicionais da região como vulneráveis a pressões antrópicas, como a insegurança hídrica e o uso indiscriminado de agrotóxicos, e a ameaças climáticas, como a redução das chuvas e eventos extremos. As principais pressões antrópicas identificadas são a agricultura, a pecuária e a construção de hidrelétricas, que ameaçam a estrutura e o funcionamento do ecossistema pantaneiro, essencial para a manutenção da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos. O objetivo principal desta tese é analisar o papel do Ministério Público do Estado de Mato Grosso na proteção do sistema de baías Siá Mariana/Chacororé contra as pressões das mudanças climáticas e as ações antrópicas. A pesquisa busca identificar as principais ameaças socioambientais percebidas pelas comunidades tradicionais, avaliar a eficácia das políticas públicas, como a "Lei do Transporte Zero", e propor a criação de uma Unidade de Conservação do tipo Reserva de Desenvolvimento Sustentável como uma estratégia de gestão e adaptação que valorize a participação comunitária e os saberes locais. A pesquisa é estruturada em três capítulos, cada um com uma abordagem metodológica específica. O primeiro capítulo utiliza a matriz DAFO (Dificuldades, Ameaças, Fortalezas e Oportunidades) e entrevistas semiestruturadas com comunidades tradicionais (Sesmaria Boa Ventura e Água Branca), aplicando o método Bola de Neve para a seleção dos entrevistados. O objetivo foi analisar como essas comunidades percebem e se adaptam às alterações socioambientais e às políticas públicas. O segundo capítulo analisa audiências públicas sobre a "Lei do Transporte Zero" no Pantanal mato-grossense, com a transcrição e análise de manifestações de 123 participantes, incluindo pescadores, pesquisadores e representantes institucionais, para compreender as percepções e os impactos socioambientais da legislação. O terceiro capítulo propõe a criação de uma Unidade de Conservação (UC) do tipo Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) como estratégia de adaptação e mitigação de impactos, com base na Lei nº 9.985/2000, visando a proteção da água, da biodiversidade e da cultura local por meio de gestão participativa. A análise integrada dos dados de campo, depoimentos e avaliação de políticas públicas permitiu uma compreensão holística dos desafios enfrentados na região. Os resultados do estudo revelam um cenário complexo. A análise DAFO demonstrou que as comunidades tradicionais enfrentam dificuldades como insegurança hídrica (18,87%) e alimentar (15,09%) e ameaças como a insegurança ambiental (27,59%) e o uso de agrotóxicos (10,34%). Em resposta, elas desenvolvem adaptações, como a construção de poços e a alteração do calendário agrícola, reincorporando conhecimentos ecológicos tradicionais como mecanismo de resiliência. A análise das audiências públicas sobre a "Lei do Transporte Zero" revelou um forte descontentamento: 90% dos oradores se posicionaram contra a legislação, apontando a falta de embasamento científico e os impactos negativos sobre os pescadores artesanais. A tese conclui que a lei criminaliza aqueles que vivem da pesca, em vez de combater os verdadeiros causadores dos impactos ambientais, e que a substituição da pesca por turismo ou pesque e solte viola os saberes tradicionais. A proposta de criação de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) é apresentada como uma solução para conciliar a preservação ambiental com o uso sustentável dos recursos pelas comunidades, garantindo sua participação na gestão e a valorização de seus saberes e práticas. A pesquisa conclui que a preservação do Pantanal exige uma abordagem integrada que considere a interdependência entre os aspectos ecológicos, socioeconômicos e culturais. As comunidades tradicionais, apesar de sua resiliência, estão em situação de vulnerabilidade diante da ineficácia da governança ambiental e de políticas públicas inadequadas. A tese sugere que a criação de uma RDS é uma estratégia promissora para proteger os serviços ecossistêmicos vitais do Pantanal e, ao mesmo tempo, empoderar as comunidades locais, combatendo a invisibilidade política e assegurando a sustentabilidade de seus modos de vida. Em suma, a proteção desse patrimônio natural só será efetiva se houver integração de políticas públicas, participação comunitária e mecanismos econômicos que promovam o manejo sustentável, assegurando que o Pantanal continue a sustentar a vida e a cultura de suas comunidades e a prover benefícios ambientais para toda a sociedade.